Se eu pudesse voltar, eu voltaria para a casa antiga dos meus avós, onde seus filhos foram criados e onde eu ainda vivi com eles boa parte da minha infância. Quando tinha uma oportunidade ia correndo pros braços deles. Eu sentia que lá era meu refúgio, meu lugar seguro, onde eu sempre tive amor.
Eu lembro das noites à luz das candeias quando ainda não tinha energia no interior onde eles moravam. O cair da noite lá era sempre aconchegante pra mim. Quando meus tios adultos que ainda moravam com eles iam para escola no povoado a noite, eu ficava em casa com o vô e a vó.
Depois
do jantar, cedo por volta das 7h, ficava tudo silencioso
. O vovô ia pra
sua rede que ficava num cantinho da sala. E eu ia deitar na rede com
ele até a vó terminar de arrumar as coisas e lavar as louças da janta.
Eu ficava deitada com o vô e era uma sensação de estar protegida..
Protegida de toda maldade, de toda dor do mundo.. E ele contava as
histórias dele e nós rezavamos a oração do anjo antes de dormir que eu
sempre pedia pra ele repetir do jeitinho diferente dele: "Santo anjo do
Senhor, meu zeloso guardador.. Se eu bem coberto for não terei medo nem
pavor.."
E era nessa simplicidade que eu vivia a maior parte dos primeiros anos da minha vida. Era tudo o que de melhor eu poderia ter tido. O vô e vó como pai e mãe na maior parte do tempo. Sempre pensei neles assim.
E, agora, depois desse ano terrível, depois de não ter mais o vô aqui no mundo. E já se passaram 3 meses. Mas ainda dói. Dói pq não tenho certeza de nada. Porque tudo é incerto.. E eu quero muito que exista essa vida eterna que sempre nos prometeram.. Que possamos reencontrar todas as pessoas que nos foram queridas, um dia.. Quem sabe?
Agora, eu só queria voltar para o lugar dessas lembranças, para o aconchego e conforto da casinha antiga dos meus avôs. E dormir ao som do velho radinho de pilhas.. Á luz das candeias.. Com o friozinho da noite no sertão.. Ouvindo as orações dele antes de dormir.. E a boa comida e todo cuidado da minha vó.
Queria poder ter os dois para sempre. Mas agora tudo é tão diferente. Ainda tenho a vó e agradeço a Deus por isso, mas a casa é diferente agora.. Não é mais a velha casa onde meus tios e minha mãe cresceram.. Tem a energia elétrica.. E tem também algumas coisas maldosas que pessoas falam ou fazem que me afastam de ir tanto para lá quanto quando eu ia quando pequena.. Pois naquele tempo nada que meus tios falassem eram vistas com maldade por mim, mas agora depois que a gente cresce, algumas palavras e atitudes são difíceis de suportar.
Agora eu sinto que a minha casa, o meu quarto é o meu refúgio, é um lugar seguro onde posso me proteger de toda dor e maldade do mundo lá fora. Muitos não entendem porque é tão difícil pra mim sair de casa. Parece que aqui o medo não vai me paralisar como quando eu saio às vezes e volto pra casa com medo por ter uma crise de ansiedade no meio da rua ou num supermercado lotado de gente.
E, então, hoje, agora tudo o que eu queria era o abraço e o aconchego do meu avô.. E as histórias dele.. E aquele sentimento que eu tinha de que só por estar perto dele estava tudo bem.. E hoje não tenho mais. E não tem uma pessoa nessa vida que me passe esse mesmo sentimento.